quinta-feira, novembro 18, 2010

Movimento dos Barcos


Desta vez, mágoa nos cortou a voz:
Extenuados, desembarcamos do sonho
Como se voltássemos de uma
Longa e maravilhosa viagem!

Atônitos, sentidos ainda atordoados,
Nem sequer colocamos as malas
No chão para o último abraço;
Apenas um leve beijo de despedida —,

Um nada, perto de tudo que
Juntos vivemos nesses meses!
Demos as costas um para o outro,
E, letárgicos, apenas caminhamos

Ainda sem saber como serão os dias,
Sem a presença mágica de um no outro!
E sem conseguir olhar para trás,
Caminhamos lentamente pelo cais.

O peito aperta, sufoca, mas o que fazer?! 
Vamos em frente, apenas.
Porém, os sentimentos que experimentamos,
Não podem mais ser recolhidos,

Passaram a fazer parte de nossa essência.
Assim, forçosamente continuaremos,
Ainda por um bom tempo,
A carregar fragmentos um do outro.

Mas agora, enquanto caminhamos,
De real, e por um breve instante,
Só o movimento dos barcos,
Como disse o poeta, o eterno movimento!

E nós, na distância desse cais infinito,
Nos apartando, imagens sumindo, sumindo...
Até nos perdermos por entre
As gentes e as coisas da vida outra vez.

[Para Ana Lucia, em algum dia de 1997]